domingo, 15 de abril de 2018

England is Mine (da Elizabeth e nossa também!)




Semana passada, entre risos e lembranças na despedida da amiga que morava em Londres e está de passagem pelo Brasil, ouvíamos The Smiths. Mais do que propício, já que essa banda foi algo fundamental para nossa geração, e trilha sonora de muitas festas, amores, dores... Então aproveitei o clima e assisti England is Mine. Esqueça a crítica não favorável, não se trata de ser bom ou ruim, se trata de termos vivido, ouvido e sentido o tempo e a letra dessas músicas. Mr. Moss, enquanto o jovem Steven Patrick Morrissey (Jack Lowden) líder da banda, é um capítulo à parte, um filme à parte, é quase tudo sobre ele. Polêmico e mal compreendido desde sempre, podemos perceber a dificuldade de alguém sensível em se mostrar para o mundo, e talvez o mais difícil, aceitar sua própria fraqueza. Apesar de ter o mesmo diretor (Mark Gill) do incrível, triste e sonoricamente impecável Control, sobre o nascimento do Joy Division e morte de Ian Curtis, England is Mine é pouco menos musical, mais profundo, literal e poético. Não dá para falar muito mais que isso, veja, ouça, sinta também, and God Save de Queen. 



Importante saber: Mr. Moss não concordou com esta quase biografia, e por isso não autorizou a reprodução de nada relacionado a banda. Ele é assim, você perceberá melhor agora essa tal estranheza. Mas, tem outros sons incríveis que ajudaram a definir o universo deste lindo gigante tímido da música. 

domingo, 18 de março de 2018

Newness - Novidade




O filme está em cartaz na Netflix e “APPresenta” o atual modus operandi dos relacionamentos. A palavra novidade, além de representar o desconhecido, também tem outro significado importante: 

B infrm. imprevisto, contrariedade. "esperava não encontrar nenhuma novidade naquela viagem"
Os viciados, aflitos e incansáveis dedos que deslizam sobre os aplicativos de encontros temem diariamente essa situação, mas não desistem. Martin (Nicholas Hoult) é um farmacêutico divorciado que ainda está perdido entre o fim do casamento e vida de solteiro, Gabi (Laia Costa) é uma ajudante de fisioterapia que larga tudo pela metade porque se entedia facilmente. 

FASE 1 - É difícil acertar um bom encontro, Principalmente se não estiver verdadeiramente disposto, presente, e quiser apenas sexo. E se for só isso, sem problemas. Mas, lembre-se é uma troca, não uma competição para ver quem acaba primeiro. E independente do desejo, ainda assim, precisa literalmente olhar a outra pessoa, ler a vontade na/da menina dos olhos. Elas falam muito, tanto que nossas iris são como digitais, não existe ninguém com outra igual.  
FASE 2 - E quando é incrível e acontece uma conexão verdadeira, o que devemos fazer? Estava descrito no perfil? Não, nunca está. Deixar-se levar é o que geralmente dá certo. Desde que, as cartas além de lançadas estejam abertas. Jackpot!!!! Relacionar-se é abrir fronteiras, mostrar seus esconderijos e pedir ajuda quando seus monstros pessoais o atacarem. Caso contrário, quando acontecer o primeiro desacordo, não precisa nem ser um problema, corre-se de volta para a zona de conforto virtual. Lá não há variações e nem profundidade. O horizonte é plano, as pessoas são rasas e todos fingem ser felizes. 
FASE 3 - Nunca diga gosto de você, e jamais eu te amo e aja no modo: seja como for. Amar é saber fazer silêncio juntos e não precisar de mais nada. É ser preenchido pela respiração do outro quando essa te faltar. Ter as mãos sempre entrelaçadas para medir o calor e a pulsação do sentimento. Relaxar e encostar levemente o nariz no ombro e sentir o cheiro do perfume, do amaciante, de casa. Relacionamento não é destino, é uma escala. Às vezes pulamos algumas, geralmente por ansiedade, noutras nem tentamos. Ser adulto não é emocionante, é chato e previsível. Não há fogos de artifício todos os dias, e às vezes nem nas datas comemorativas. Mas é calmo, delicioso e recompensador numa manhã de domingo, acordar e tomar café na cama com os lençóis ainda úmidos do melhor e mais gostoso sexo sóbrio que escolheu pra você.


O filme é honesto, delicado e carregado de lições importantes. Sejamos reais e sinceros na world “wilde” web e principalmente com quem se propôs estar ao nosso lado, seja por algumas horas ou pelo resto de nossas vidas.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Call Me By Your Name





É verão, anos 80 e um e icônico Fiat 147 verde adentra a morada do Professor Perlman (Michael Stuhlbarg) trazendo seu aluno eleito do ano. O jovem escritor americano chamado Oliver (Airmee Hammer) que passará algumas semanas para receber sua orientação. O local que os abriga é uma charmosa vila ao norte da Itália, residência de veraneio da família. Pai americano, mãe francesa, ambos acadêmicos. O filho Elio (Timothée Chalamet) tem 17 anos, fala fluentemente as línguas nativas do ambiente, às vezes misturando tudo em uma única tomada, abusando certeiramente dos gestos e pronúncias característicos. Ele escreve música, toca piano, violão, além ser de um ávido leitor. Sempre achei que casas assim, com pessoas tão diferentes e instruídas havia uma nobreza. Uma visão diferente de mundo e do mundo, e este filme confirma a minha teoria. Tudo isso em meio a um cenário de causar inveja ao Éden. Os jardins, as frutas do pomar ou a piscina de pedra no quintal, é onde o diretor italiano Luca Guadagnino (A Bigger Splash) se engrandece. Ele dosa sabiamente o clima sensual do “dolce far niente” com passeios incansáveis em um tênis Converse. Uma mistura de Bernardo Bertolicci com Sofia Coppola. É bonito de ver, pitoresco, delicado, contemplativo e sexual de forma até lúdica, com todas aquelas estatuas e fragmentos de nudez. Longe, muito longe de ser um filme gay cheio esteriótipos. 





Oliver tem 24 anos, é o tipo dionisíaco que parece ter saído de uma casa estudantil Macho Alpha, ganhadora dos prêmios sabedoria e beleza. Além disso, ele é confiante, rápido e voraz. Atenção para as cenas em que ele está comendo, Elio sempre aparece paralisado nesses momentos. Afinal, é extremamente sedutor ver alguém com tanta sede e vontade por algo. Durante uma festa na cidade, em que todos dançam, se divertem e se diferem ao som de: The Psychedelic Furs - Love My Way (sempre me faz querer dançar igual), uma intenção real começa incomodar. É encantador, delicado e possível. Sem causar estranheza nenhuma. Quem dera as relações héteros tivessem tanto cuidado, beijos, toques e cheiros. Isso se perdeu há algum tempo, só vejo gente cheia de limites e recalques. Poucos filmes usaram tão bem o próprio título para criar uma atmosfera perfeita e apresentar a intimidade das personagens. Aliás, uma das melhores coisas já filmadas é a cena do Pêssego. Quando Oliver quer provar literalmente que o seu desejo não tem pudores e ele adoraria degustar o fruto proibido. Elio ingênuo não entende o gesto e se desespera. Não é só de amor e sexo que trata o filme, é sobre descobrir como amar e aceitar as pessoas, qualquer uma que esteja em nosso convívio diário. Tanto, que o próprio Professor diz em uma conversa esclarecedora: 

Nós arrancamos tanto de nós mesmos para nos curarmos depressa das coisas, que ficamos esgotados perto dos 30 anos. E temos menos a oferecer toda vez que começamos algo com alguém novo. Mas se obrigar a ser insensível...assim como não sentir nada...Que desperdício!

A verdade foi dita. Abra as portas e janelas da vida, deixe que o arranhar do chão aconteça. E como diria Oliver:
Later! 

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

A Forma da Água






Encantador e sutilmente fluído este filme tem treze indicações ao Oscar. E não é por falta de motivos. O diretor Guillermo del Toro (Labirinto do Fauno) tem um poder indiscutível de nos afundar numa fantasia e nos manter com fôlego até o final. É uma experiência enriquecedora, quando fala-se de assuntos tão densos e turvos no auge da Guerra Fria: política, espionagem, racismo, assédio moral, sexualidade, entre outros tabus na década de 60. E mesmo em se tratando de tantos problemas, é brilhante como deve ser. Um verdadeiro conto de fadas, surreal! A Princesa é a órfã muda Elisa (Sally Hawkins), faxineira que só começa a trabalhar à meia-noite no laboratório. O Monstro é o agente Strickland (Michael Shannon), encarregado da fortaleza militar que aprisiona e estuda o Príncipe. Um anfíbio, literalmente o homem sapo da Amazônia capturado pelo governo dos EUA.




A trilha sonora é um personagem à parte conduzindo todos os momentos, um primor. Para alegria brasileira podemos ouvir Chica Chica Boom Chic de Carmen Miranda e Babalu, uma pena essa última não ser a versão da diva Ângela Maria. A fotografia seduz, e claro, a melhor cena acontece no apartamento que fica sobre um cinema. Lá onde tudo torna-se possível na tela, inclusive na nossa. E como manda o figurino, o narrador, amigo e vizinho Giles (Richard Jenkins) ainda nos deixa um poema: 

“Incapaz de definir a tua forma, eu o vejo ao meu redor. Tua presença preenche meu olhos e com o teu amor, acalanteia meu coração, pois tu está em todos os lugares” 



terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

A Ghost Story


Esqueça o título, A Ghost Story não é um filme da moda sobre fantasma, ele trata da grandeza do tempo para C (Casey Affleck) e M (Rooney Mara). Como vivemos e morremos. O diretor jovem David Lower (Amor fora da Lei) nos insere nas cenas não através do jogo de câmeras, mas de incômodas e intermináveis tomadas, justamente para que tenhamos a mesma sensação dos atores, do ambiente, do vazio e da dor de perder alguém. Mas, se morrer não é o fim, o que fazemos depois? Isso é o que nos prende à tela. Ficamos completamente entorpecidos e imóveis nesta dúvida. Tarefa difícil para um filme sem muitas falas. E para preencher essas lacunas, nada melhor que uma música para sintonizar a lembrança, e quase, quase reproduzir a presença. C é compositor e cria essa melodia, que depois mais parece um prelúdio. M é sua melhor e amada ouvinte. Cena MA-GIS-TRAL: 




Assim, continuamos sedentos por respostas, e elas vem, no tempo certo. É finito e libertador quando entendemos o ciclo da vida, quando nos desprendemos dos sentimentos, do material, físico e afável. Viver é constância e repetição, se não entendermos que o é necessário para seguir. M entendeu e segue apenas deixando anotações nas casas em que morou, já que mudar também é matar um pouco da gente. Na minha crença (felizmente) não há fim, somos almas eternas com novas oportunidades e histórias para criar infinitamente. 


Que a nossa evolução seja gentil! Afinal, quem gosta de recomeços quando a única certeza clichê da vida ainda é a morte?

domingo, 13 de agosto de 2017

Atypical - Poderia ser a minha família?




Hoje é dia dos pais, e a melhor coisa que pode fazer no final da tarde é assistir o seriado da Netflix Atypical, e se perguntar: Estou preparado para ser pai ou mãe? Serei mais feliz e completo? E se esse filho que a sociedade me cobra tanto for especial, ela aceitará? Terei maturidade e força para entender e superar os problemas? Ser normal diante dos outros nunca foi fácil, tampouco óbvio. E esta série é a comprovação de que um autista não é tão diferente assim. Mesmo carregada de muito humor, não deixa de lado a seriedade da condição, pessoal e principalmente familiar. Isso mudará sua visão de mundo, do seu especificamente, aquele que criamos ao redor da nossa própria pele e sentidos. 




Eu me vi em várias situações como Sam, apenas sentiria e reagiria com menor violência, verbal e física. Assim como ele: odeio comer em lugares barulhentos, gosto de ficar sozinha por um tempo, repito uma sequência de palavras quando estou muito estressada (o mantra Om Mani Padme Hum, ao invés de espécies de pinguins). Simples e comum. No mais é se preparar para o preconceito e situações adversas que virão de fora, e muitas, muitas dentro da própria casa. Sejam honestos consigo mesmo e reflitam sobre construir uma família, imaginem-se como Else e Doug. O melhor exercício de humanidade é colocar-se no lugar do outro. 

segunda-feira, 10 de julho de 2017

OKJA - Melhor lição de Yoga






Você pode não mudar nada da sua vida depois de ver este filme. Mas, certamente entenderá o que é AHIMSA (अहिंसा ) - uma palavra muito usada na filosofia do Yoga que significa "não ferir" e geralmente é traduzida como "não violência". OKJA é uma mistura de História sem Fim com Fast Food Nation, incrível e chocante. Prepare-se para repensar não só o que você come, mas como isso vai parar na sua mesa. E não está relacionado só a carne, e como você enxerga ou trata os animais. E sim a vida cotidiana, desde um simples tomate até os pratos mais sofisticados e caros possíveis. O preceito de "não causar dano" inclui também intenção, palavras e pensamentos para com a família, amigos, trabalho e tudo ao redor. Viver é uma fantasia cheia de verdades. Machucar os outros é machucar a si mesmo.